Acho
que foi em 1986... O tempo é um carrasco implacável quando não registramos as
datas de maneira eficaz. Daí, contamos apenas com a imprecisão das nossas
memórias. Mas, se estiver errado quanto às informações deste texto, peço que me
perdoe.
Naquele
ano, alguns leitores de quadrinhos começaram a se reunir num pátio do Centro
Cultural São Paulo, perto da Estação Vergueiro do Metrô, na cidade de São
Paulo. Eles, ou melhor, nós (eu era um deles) nos encontrávamos lá quase que
religiosamente todas as manhãs de Domingo... às 9h!!! Imagine só: adolescentes
se reunindo nas manhãs de Domingo às nove da manhã para falar sobre quadrinhos!
Éramos muito apaixonados por HQs mesmo... E o grupo também tinha um nome
pomposo: Conclave dos Quadrinhos!
Quem
reuniu esse bando de doidos (porque só doidos acordariam cedo no Domingo pra
bater papo sobre quadrinhos!) foi o João Paulo Lian Branco Martins, que, na
época, era tradutor de quadrinhos da Editora Abril. E, quando os encontros
ficaram mais e mais frequentes, foi de comum acordo que iríamos produzir um
fanzine sobre HQs!
Hoje
isso pode não parecer grande coisa, quando temos acesso ilimitado a internet
nos nossos próprios celulares. Mas estou falando dos longínquos anos 1980, uma
época em que qualquer informação era disputada a tapa e escondíamos as revistas
importadas da Marvel e DC dentro de outras revistas menos procuradas nas
prateleiras das livrarias LaSelva ou Siciliano para buscá-las depois, quando
tivéssemos dinheiro no bolso! Crise nas
Infinitas Terras, Batman: O Cavaleiro das Trevas ou Watchmen acabavam de ser lançadas nos EUA. Só pra você se situar
melhor no momento histórico, 1986 foi o ano em que Paul Hogan fazia sucesso nas telas com Crocodilo Dundee! Também foi o ano em que estreou Highlander nas telonas e as salas de
cinema nunca foram tão frequentadas por casais apaixonados por causa de 9 1/2 Semanas de Amor (com o, então
galã, Mickey Rourke e a bela Kim Basinger). Mas outras produções
cinematográficas também estreavam, como Labirinto
(com David Bowie), Curtindo a Vida Adoidado (Matthew Broderick), o remake A Mosca (de David Cronenberg) e O Nome da
Rosa (com Sean Connery), entre
tantos outros. Também foi o ano em que a banda inglesa Queen fez um dos maiores shows de todos os tempos em Wembley e Metallica lançou seu álbum Master of Puppets. Ah! Também foi o ano
em que chegava ao fim o programa de TV Balão
O Teatro Mágico. E também foi quando aconteceu o terrível acidente nuclear
de Chernobil, na Ucrânia...
Nesse
cenário, quando a internet era um sonho distante e quase impossível, nós nos
reunimos e decidimos que um fanzine seria feito. E seria um fanzine cheio de
informações, com entrevistas, resenhas, checklists etc. Muito material que
usávamos como fonte era extraído da fantástica revista americana Amazing Heroes, uma publicação que dava
de dez a zero na maioria das revistas especializadas que surgiriam depois!
E começamos
a discutir as pautas das matérias que fariam parte do primeiro número do Portal do Universo (este seria o nome do
nosso fanzine)! Tudo definido, cada um de nós se incumbiu de uma tarefa e
arregaçamos as mangas. O João Paulo
conseguiu liberar acesso de alguns de nós para fazer uma entrevista com algumas
pessoas da Editora Abril (sua divisão Infanto-Juvenil ficava na Rua Bela
Cintra, 299, paralela à Rua Augusta, em São Paulo) e também cuidou da edição
final da publicação. Muitos de nós passávamos horas em nossas casas redigindo
matérias e datilografando (não, não existiam micros naquela época!). Então,
depois de muito custo, o fanzine ficou pronto! Tudo xerocado e grampeado!
Isso
tudo se perdeu pra mim depois de tantas mudanças de casa etc. Não fiquei com
nenhum exemplar em mãos. Mantive contato com algumas pessoas do Conclave e outras voltei a encontrar no
Facebook. E foi graças à uma dessas
pessoas que consegui um exemplar da primeira edição do Portal do Universo. Sem a gentileza de Wilson Simonetto, que me emprestou seu exemplar para ser escaneado,
eu jamais teria como postar todas as páginas desta publicação pré-histórica.
Então, Wilson, você tem minha eterna
gratidão!
Agora,
fique à vontade para ver e ler uma espécie de documento arqueológico feito por
fãs de quadrinhos. Mas tenha paciência com o conteúdo. Éramos jovens. Éramos
ingênuos. Éramos tolos. Mas, acima de tudo éramos sonhadores!
Como
sempre, desejo uma boa leitura a você!